Resquicios da ditadura.
Segundo o antropólogo Geert Hofstede (Cultures and organizations: software of the mind, 1991), os países latinos caracterizam-se por ter uma elevada distância ao poder (autoridade) e uma grande aversão à incerteza. Portugal destaca-se por ter a maior aversão à incerteza dos países latinos e a segunda maior dos mais de 50 países estudados por aquele autor. Já os países anglo-saxónicos têm uma menor distância ao poder (mais autonomia) e uma muito menor aversão à incerteza. Esta diferença explicará em grande medida a origem e sucesso do sistema liberal nos países anglo-saxónicos em comparação com os países latinos. Receitar a solução liberal, versão original, num país com características muito diferentes dos de origem parece não ser a melhor via.
O que seria então um liberalismo de sabor latino? Seria um que reconheceria as características locais ou regionais, mas simultaneamente tentaria conduzir explicitamente a uma menor distância da autoridade e uma menor aversão à incerteza. Quando se adoptam argumentos de não se poder dar liberdade de escolha da escola aos pais, segundo o argumento salazarento, de que "os portugueses não estão preparados", está-se a reconhecer a característica de défice de autonomia, mas não se está a fazer nada para a combater. Trata-se de uma política pública que perpetua a menoridade cívica. Este caso ainda é mais ridículo porque o Estado não está a substituir a escolha dos pais por uma sua escolha, mas sim por uma regra exclusivamente burocrática, sem a menor sombra de preocupação com o que será melhor para o aluno.
O medo da incerteza, por seu lado, leva a uma regulamentação excessiva e ao medo de decidir. Um dos casos recentes mais caricatos foi o impasse perante o pedido de abertura do túmulo de D. Afonso Henriques, porque não havia legislação específica! Perante um simples pedido como este, os sucessivos dirigentes não conseguiram decidir com base em raciocínios simples e bom senso, tiveram que ir até à ministra. Que aliás, parece ter querido exercer a sua autoridade (uma característica latina como vimos acima) num caso tão simples como este.
Outra questão mais relevante é a dos preços da energia. Para diminuir a incerteza sobre estes preços os governos fixaram aumentos em linha com a inflação. Mas isto é uma ficção. Portugal importa quase 90% da energia que consome e por isso é completamente lírico qualquer governo decretar que o preço da energia não sobe mais do que a inflação (recordem o que tem acontecido ao preço do petróleo). Esta tentativa de diminuir a incerteza não só está assim votada ao fracasso como reforça o medo de lidar com a incerteza. A incerteza é inerente à vida e fingir que a conseguimos afastar não ajuda, atrasa o desenvolvimento cívico necessário.
O que seria então um liberalismo de sabor latino? Seria um que reconheceria as características locais ou regionais, mas simultaneamente tentaria conduzir explicitamente a uma menor distância da autoridade e uma menor aversão à incerteza. Quando se adoptam argumentos de não se poder dar liberdade de escolha da escola aos pais, segundo o argumento salazarento, de que "os portugueses não estão preparados", está-se a reconhecer a característica de défice de autonomia, mas não se está a fazer nada para a combater. Trata-se de uma política pública que perpetua a menoridade cívica. Este caso ainda é mais ridículo porque o Estado não está a substituir a escolha dos pais por uma sua escolha, mas sim por uma regra exclusivamente burocrática, sem a menor sombra de preocupação com o que será melhor para o aluno.
O medo da incerteza, por seu lado, leva a uma regulamentação excessiva e ao medo de decidir. Um dos casos recentes mais caricatos foi o impasse perante o pedido de abertura do túmulo de D. Afonso Henriques, porque não havia legislação específica! Perante um simples pedido como este, os sucessivos dirigentes não conseguiram decidir com base em raciocínios simples e bom senso, tiveram que ir até à ministra. Que aliás, parece ter querido exercer a sua autoridade (uma característica latina como vimos acima) num caso tão simples como este.
Outra questão mais relevante é a dos preços da energia. Para diminuir a incerteza sobre estes preços os governos fixaram aumentos em linha com a inflação. Mas isto é uma ficção. Portugal importa quase 90% da energia que consome e por isso é completamente lírico qualquer governo decretar que o preço da energia não sobe mais do que a inflação (recordem o que tem acontecido ao preço do petróleo). Esta tentativa de diminuir a incerteza não só está assim votada ao fracasso como reforça o medo de lidar com a incerteza. A incerteza é inerente à vida e fingir que a conseguimos afastar não ajuda, atrasa o desenvolvimento cívico necessário.
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